P de Pólen

Caixa de Correio

A caixa de correio está como toda a casa, completamente forrada.

Este post foi revisado pela Dra. Adriana de O. Fidalgo do Instituto de Botânica/SP, Núcleo de Pesquisa em Sementes. Adriana é PHD em ecologia e trabalha com polinização e comportamento de abelhas nativas do Brasil.

O que é pólen?

O pólen é um pó, de fino a grosseiro, contendo micro gametófitos de plantas com sementes, que produzem os gametas masculinos (espermatozoides). Os grãos de pólen têm um revestimento duro que protege suas células, que contém núcleos espermáticos (espermas), durante sua migração dos estames para o pistilo de plantas florescentes, ou a partir do cone macho para o cone do sexo feminino de plantas de coníferas. Quando o pólen aterrissa sobre um pistilo compatível ou cone fêmea (isto é, quando a polinização ocorre), ele germina e produz um tubo de pólen que transfere o esperma para o óvulo (ou gametófito).

Simplificando dramaticamente, o pólen é a P das plantas, e para não ficar repetitiva passarei a usar a letra P para ambas as palavras que podem ser intercambiadas livremente.

Flor de Pinheiro

Sem comentários!

Durante o processo evolutivo, as plantas desenvolveram várias estratégias reprodutivas, para assegurar a sua multiplicação e colonização dos seus habitats. Os espermatófitos, ou seja, plantas que produzem flores, utilizam várias modalidades de polinização como estratégias reprodutivas. A que nos interessa em particular é a polinização anemófila, realizada pelo vento, onde as plantas produzem grande número de grãos de P, muito leves ou com extensões da exina, como os grãos de pólen alados dos pinheiros, que lhes permitem ser transportados para flores de plantas que se encontram a maior distância da que os produziu, portanto com maior probabilidade de terem um genoma diferente.

Traduzindo, os pinheiros machos produzem o P, e o vento espalha essa P por todo lado.

No Brasil só nos importamos com o P nas aulas de ciências. Passados os anos escolares não damos mais importância ao P. Isto acontece porque no Brasil a forma mais comum de polinização é a zoófila – realizada por pássaros e insetos, como abelhas e borboletas – as flores possuem características que atraem os insetos, tais como coloração, cheiros especiais e nectários. Portanto nosso ar está liberado do P para dar espaço a agentes mais importantes como a poluição, outra P super bacana.

No Brasil, graças a nossa incrível biodiversidade também temos abundância de plantas que fazem a polinização hidrófila – realizada pelas plantas aquáticas através da… tchã, tchã, tchã, tchã… Água. E também existem as plantas hermafroditas, cuidado com a malícia querido(a) leitor(a), apenas falo sobre plantas que possuem os dois sexos, e algumas delas fazem autopolinização – algumas espécies de plantas hermafroditas admitem a germinação dos grãos de pólen no estigma da mesma flor que o produziu, ou em outras flores da mesma planta; esta estratégia diminui as possibilidades de recombinação genética, mas assegura que um maior número de óvulos sejam fecundados. E não enche o ar de P.

Galhada Florida

Este é apenas um galho de um pinheiro. Imaginem quantas flores uma árvore inteira não tem.

Depois de mudar para Atlanta, que está entre as dez cidades americanas com maior índice de P no ar por metro cúbico durante a primavera, passei a me interessar por P. Antes não tinha o menor interesse por essa P que cobre tudo que toca, procurando por gametófitos. Porém, na falta da sua parceira, o P aterrissa em qualquer superfície, incluindo os nossos olhos, e se enfia em qualquer orifício, como os nossos narizes. O P é democrático e não tem preconceito de cor, raça ou religião, aqui todos nós estamos a mercê do P.

Eu que tinha crises leves de alergia em São Paulo, tenho crises épicas quando exposta ao P, ou seja, eu sou uma mutante com incrível capacidade de tolerância a dejetos químicos em forma de fumaça no ar, mas não tolero P de árvore.

Mesa do pátio coberta de pólen. Isso não é falta de lavar a mesa não, fica assim de um dia para o outro.

Mesa do pátio coberta de pólen.

A venda de antialérgicos nesta época do ano é responsável por 60% das vendas de medicamentos nas farmácias da região, sendo que eu devo ser responsável por metade destas vendas. Eu carrego na bolsa gotinhas para os olhos e para o nariz. Um dia desses pinguei a gotinha de olhos no nariz, e só percebi a besteira quando pinguei a gotinha de nariz nos olhos. É, podem rir, pimenta nos olhos dos outros é refresco mesmo, literalmente!

Ah, também carrego uma EpiPen, seringa de auto-injeção de Epinephrine, para crises que tapam de vez as vias respiratórias – nunca precisei usar, mas carrego por precaução, morrer por causa de P seria o cúmulo do absurdo. Imagino a reportagem do Fantástico: Brasileira morre nos Estados Unidos por causa de P americano(a).

 

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About Adriana Gomes

Adriana é brasileira nascida em São Paulo. Em 1997 seu marido, Flavio Gomes, recebeu uma oferta de transferência ao exterior. Desde então ela já morou em dois estados americanos, Flórida e Georgia, e também teve a oportunidade de viver por um ano em Xangai, na China. Em cinco mudanças internacionais incluindo um bate-e-volta de dois anos ao Brasil, Adriana teve seis endereços diferentes nos últimos quatorze anos. Sem dúvida ela já acumulou muitas estórias que pretende compartilhar aqui no Hallo Hello, acompanhem!